Gilberto Costa
Correspondente da EBC em Portugal
Lisboa - Os brasileiros formam
a
maior colônia de estrangeiros em Portugal. Em março de 2011, conforme o
censo, havia 109,7 mil brasileiros. Há tantas pessoas procedentes do país que as
brasileiras com 34 anos, solteiras, com ensino médio e trabalhando em serviço de
limpeza
formam o perfil prevalente entre os imigrantes.
Os brasileiros que vieram para Portugal, especialmente na última década,
foram atraídos pela perspectiva de emprego em áreas que não exigiam
qualificação, como a construção civil, os serviços de bar e restaurante e o
emprego doméstico. Com a crise econômica, essas atividades perderam dinamismo e
já pode ser notado
um
movimento de retorno entre os que se empregaram nesses setores.
A socióloga Filipa Pinho, coordenadora da equipe técnica do Observatório da
Emigração e doutora pelo Instituto Universitário de Lisboa (Iscte-IUL), não
acredita porém que haverá um regresso em massa para o Brasil porque muitos
estabeleceram raízes em Portugal, aguardam a autorização de residência
definitiva ou podem buscar emprego em outros países da Europa. A seguir, a
entrevista da especialista à
Agência Brasil.
Agência Brasil (
ABr) - Qual o perfil
socioeconômico dos brasileiros que foram para Portugal na última
década?
Filipa Pinho - Os brasileiros que emigraram na
última década - sensivelmente desde o fim dos anos 1990 - inseriram-se
majoritariamente no segmento menos qualificado do mercado de trabalho, os
setores da construção, de restauração, comércio e serviços. Isso,
independentemente de alguns terem habilitações superiores ao que lhes era
pedido. Grande maioria veio sem visto - não é necessário quando vem a turismo -
e permaneceu além do prazo estabelecido para turista (90 dias). A regularização
se deu ao abrigo de ações extraordinárias ou decorrentes de acordos com o Brasil
(como o acordo Lula em 2003).
ABr - O que esses brasileiros ambicionavam quando vieram
para cá?
Filipa Pinho - De acordo com as entrevistas que
fiz, vinham em busca de oportunidades de melhoria de vida, em uma época em que
se queixavam do desemprego no Brasil e em que havia chances de trabalho em
Portugal. Na época em que começaram a vir, em geral a partir de Minas Gerais,
deu-se a coincidência de os controles para os Estados Unidos terem se tornado
mais rígidos, de o euro estar forte em relação ao real e, como disse, de haver
oportunidades de trabalho. A informação foi passada por meio das redes de
amizade e parentesco, e os migrantes que iriam para os Estados Unidos vieram
para cá. Para outros, que nunca tinham pensado em ir para os Estados Unidos pelo
fato de não saber a língua, Portugal se tornava uma hipótese atrativa.
ABr - A língua foi a principal motivação para escolherem
Portugal?
Filipa Pinho - Foi um conjunto de circunstâncias:
oportunidades de trabalho, facilidade em entrar no país, controle rígido da
fronteira nos Estados Unidos, euro alto em relação ao real/dólar, a língua, o
fato de conhecerem pessoas em Portugal etc, entre outras
ABr - Em que atividades esses brasileiros se ocupavam? Essas
ocupações não interessam aos portugueses?
Filipa Pinho -
Homens na construção, no comércio e na restauração, mulheres no comércio, bares
e restaurantes, serviços. Não era uma questão de não interessar aos portugueses,
era porque havia trabalho: muitos investimentos em infraestruturas para o Euro
2004, quer em construção, quer em serviços
associados.
ABr - Os imigrantes brasileiros estão
retornando? Pode-se dizer que está ocorrendo um esvaziamento da imigração
brasileira? Esse fenômeno tem a ver com a situação econômica de Portugal e do
Brasil?
Filipa Pinho - Não necessariamente "em massa". Por
um lado, podem estar retornando ou indo para outros locais, como os portugueses,
por causa do desemprego. Se tiverem autorização de residência, o problema é
maior porque a renovação dessa autorização só é feita se houver contrato de
trabalho. E, quando não há... Mas os brasileiros podem ter permanecido até
esgotar o período do subsídio ao desemprego, por exemplo. Por outro lado, haverá
muitos brasileiros empregados, com famílias constituídas em Portugal, para quem
não fará sentido sair do país. Se tiverem obtido a nacionalidade portuguesa,
mesmo a situação de desemprego não os torna ilegais, portanto poderão
permanecer. Teremos de esperar novas estatísticas dos próximos anos para
perceber os efeitos da crise na população brasileira residente em Portugal. Mas,
assim como os portugueses que estão deixando o país, o mesmo pode acontecer com
brasileiros, é claro. O fluxo de entrada tem estagnado, sim.
ABr - Há quem parta, mas há quem fique. Há diferença de
perfil desses imigrantes brasileiros?
Filipa Pinho - Há:
quem está empregado e constituiu família, esse tenderá a ficar. Desempregados,
como muitos portugueses, considerarão outras hipóteses migratórias, passem elas
pelo retorno ou por uma reemigração.
ABr - Conheço
casos de imigrantes brasileiros que voltaram para o seu país e depois retornaram
a Portugal, por que isso acontece? Pode voltar a acontecer?
Filipa
Pinho - Quando vieram, muitos imigrantes eram jovens. Entrevistei
pessoas que vieram com 18, 19, 20 anos, que começaram a sua vida de trabalho e
adulta em Portugal. Pode ocorrer que voltem para o Brasil e não se adaptem ou
não encontrem trabalho... Não sei, esse caso específico eu não estudei, só posso
fazer alguma reflexão sobre o que ouvi.
ABr - Com as dificuldades de conseguir emprego em Portugal,
é possível dizer que imigrantes brasileiros poderão disputar trabalho com os
portugueses?
Filipa Pinho - Pessoalmente, tenho muita
dificuldade em ver essa situação como uma disputa. Há oportunidades ou a falta
delas e um conjunto de residentes para as preencher. Eles ocuparão as vagas de
acordo com a capacidade para fazer o trabalho. Há profissões em que os
brasileiros ganharam visibilidade e estão bem conceituados, como manicures ou na
restauração, mas desconheço se ganharão ou perderão quando se trata de contratar
brasileiros ou portugueses. Não conheço casos concretos que possam servir de
exemplo.
Edição: Graça Adjuto